Além da amizade, Greil Marcus e Sean Wilentz têm outra relação em comum. Eles receberam a aprovação de Bob Dylan para criticá-lo. Ambos pertencem ao conjunto oficial dos críticos dylanescos: Allen Ginsberg, Johnny Cash, Nat Hentoff, Pete Hamill, Tony Glover, Tom Piazza. Marcus, de 65 anos, e Wilentz, de 59, admiram Dylan desde a juventude. O autor de The Times They Are A-Changin’ é para eles um símbolo quase sagrado. Os livros mais recentes de Marcus e Wilentz comentam esse objeto de grande paixão.
Bob Dylan by Greil Marcus: Writings 1968-2010 (PublicAffairs, 482 págs., US$ 29,95) e Bob Dylan in America (Doubleday, 390 págs., US$ 33), de Wilentz, vêm na esteira do aniversário de 70 anos do compositor norte-americano, a ser comemorado em 24 de maio. Neste mês, Dylan anunciou para abril quatro apresentações na Austrália. Nova York deu início à efeméride com shows e um simpósio.
A paixão de Marcus nasceu com a ajuda de Joan Baez em Nova Jersey. O ano era 1963, e Baez convidou Dylan ao palco para interpretar algumas músicas. Marcus conta que naquele momento “se sentiu convocado a observar aquele cara de ombros caídos e aparência desgrenhada”. “De onde ele veio? Qual a idade? Ele desafiou de maneira absurda a minha compreensão”, escreve o jornalista.
Assim se explica a gênese de Bob Dylan By Greil Marcus, o terceiro livro do crítico sobre o compositor. (Os outros são Like a Rolling Stone: Bob Dylan at the Crossroads e Invisible Republic: Bob Dylan’s Basement Tapes. A convite de Dylan, ele escreveu o encarte de The Original Mono Recordings).
O volume reúne trabalhos publicados na imprensa entre 1968 e 2010. Inclui um texto de estrutura fragmentada sobre o álbum duplo Self Portrait. Divulgado na revista Rolling Stone de 23 de julho de 1970, ele é considerado uma das melhores críticas sobre uma gravação. Nesse escrito, o jornalista exercita a sua principal crença sobre o exercício da crítica: “Eu me interesso pelos efeitos das músicas de Dylan em mim e nos outros, e não pelo significado delas.”
Greil Marcus se confessa fã de Bob Dylan. Está entre “aqueles que procuram os cigarros que a lenda joga no chão.” Ele se refere a uma descrição de Paul Simon a respeito do fascínio exercido por Dylan. Segundo Simon, o artista desperta com intensidade, tanto nos admiradores como nos detratores, a vontade de participar da sua criação. “Faminto por um símbolo, o mundo costuma segui-lo por aí, à espera de que ele deixe cair uma guimba de cigarro”, explica Simon. A parte mais assustadora dessa história é que as pessoas, diz Simon, acham um sentido na bituca descartada pelo ídolo. Marcus afirma, no entanto, que o tempo deu mais frieza às suas análises.
Na divisão de seu livro, 1992 é o ano em que Dylan apresenta novidades na composição em relação aos anos 1960, quando é transformado em mito. Para Marcus, o disco Good As I Been to You (1992) é uma síntese – feita por um criador mais livre – de toda a produção anterior. Não à toa, um pouco mais da metade do volume apresenta textos dos últimos 13 anos. O jornalista termina dizendo que a música The Times They Are A-Changin’ ganhou pleno sentido somente com os novos ares trazidos pela eleição de Barack Obama.