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Leia entrevista com Carla Körbes, primeira-bailarina do Pacific Northwest Ballet
Check an interview with Carla Körbes, a principal dancer at the Pacific Northwest Ballet
Carla Körbes tem os Estados Unidos a seus pés. Aos 31 anos, no auge da carreira, a bailarina brasileira é unanimidade entre a crítica americana. “Quando ela dança, o tempo para”, publicou a revista “Vanity Fair”. “Reconhecida como uma das bailarinas mais notáveis da América, ela é uma mulher encantadora com cabelos volumosos de fios dourados, uma voz de sotaque delicado e um senso de humor seco”, descreveu reportagem do “The New York Times”. “Ela é a melhor coisa vinda de Seattle depois do Starbucks”, brincou o “New York Post”.
O elogio bem-humorado do tabloide nova-iorquino se refere à cidade-sede da rede de cafés e do Pacific Northwest Ballet (PNB), companhia onde Carla é primeira-bailarina desde 2006. No meio do mês, a brasileira esteve em Nova York para apresentações que celebraram os 40 anos do PNB. Dançou “Apollo” (coreografia de George Balanchine) e “Romeu e Julieta” (Jean-Christophe Maillot) no New York City Center. Ao avaliar essas performances, Alastair Macaulay, o crítico sênior de dança do “Times”, reforçou uma vez mais sua admiração por ela. “Quando Carla Körbes representa Terpsícore em ‘Apollo’, a companhia mostra uma bailarina com quem todos os praticantes de balés do Balanchine podem hoje aprender.”
O retorno a Manhattan é significativo para Carla, pois ali ela desenvolveu a sua trajetória bem-sucedida. Quando estreou nos palcos do New York City Ballet (NYCB), 12 anos atrás, suas qualidades logo chamaram a atenção. Os especialistas exaltaram o fato raro de ela ser uma “bailarina lírica”. “Lirismo significa dançar conforme a música”, afirma Carla em entrevista ao Valor. “O jeito de mexer os braços é mais lento, redondo, solto. Não há movimentos bruscos.” Essa característica se transformaria, segundo Macaulay, “na representação de uma beleza elegante” que atualmente “é inigualável” nos EUA.
Antes de entrar no NYCB, Carla estudou na School of American Ballet, a escola da companhia nova-iorquina. Ela se mudou para Nova York em 1996, após ser descoberta por Peter Boal em visita ao Ballet Vera Bublitz, em Porto Alegre. Na ocasião, Boal, a estrela do NYCB, e Carla, então com 14 anos, dançaram “Apollo”. “Boal disse: ‘Essa garota tem muito talento. Ela tem de sair [do país] imediatamente, e não só quando completar 18 anos'”, recorda Carla.
Não cogitava mudar-se para os EUA. Os planos eram terminar o ensino médio e, quem sabe, fazer audições na Europa. Na verdade, quando Carla pensava em Nova York, o American Ballet Theater (ABT) vinha à sua mente. “Eu me imaginava dançando clássicos como ‘O Lago dos Cisnes’ e ‘A Bela Adormecida’.”
Fundado em 1937 e considerado o representante da tradição, o ABT ganhou um contraponto no NYCB, criado dez anos depois por Balanchine em parceria com o empresário americano Lincoln Kirstein para ser um espaço de experimentação. Nascido na Rússia, Balanchine (1904-1983) ampliou a linguagem clássica, ao intensificar elementos básicos do vocabulário do balé e moldar os passos dos bailarinos de acordo com o tempo musical. A música é fundamental nas coreografias de Balanchine, como provam seus trabalhos bem-sucedidos com o compositor Igor Stravinsky (1882-1971), associação que mudou a história do balé no século XX.
“Para mim foi fácil, pois cresci com música clássica em casa”, diz Carla, que começou a dançar aos 5 anos. “Mas a minha mãe só me deixou fazer a audição para a School of American Ballet em 1996, porque pensou que eu não ia passar.” Sem falar inglês quando chegou, Carla cumpriu a primeira temporada de treinamentos. “Pude continuar porque Alexandra Danilova doou em testamento uma herança para manter os meus estudos na escola.” Bailarina e professora, Alexandra Danilova (1903-1997) foi celebrada pela versatilidade de movimentos, as pernas “fotogênicas” e a presença de palco intensa. Ela e Balanchine deixaram a União Soviética em 1924, foram namorados e com outros dançarinos fizeram a companhia nova-iorquina progredir. “De certo modo, eu trato as audiências americanas como minhas crianças, pois ajudei a educá-las”, Alexandra escreveu em sua autobiografia.
O encantamento de Carla com as coreografias do NYCB foi imediato. “O balé pode ser um pouco rígido, seja na postura da cabeça ou no movimento das mãos e dos braços. Balanchine liberou os bailarinos”, diz. “Outra vantagem é o corpo de baile com seu estilo mais dinâmico e atuante.” A maior qualidade de Carla, porém, se tornou o anúncio de um obstáculo. Como foi entendida como bailarina lírica, ela poderia representar somente personagens com essa característica. “Percebi que depois de dez anos, mesmo sendo promovida, eu faria sempre os mesmos papéis.”
Em 2006, um ano após se tornar solista do NYCB, Carla foi contratada pelo Pacific Northwestern. “Desejava ser uma bailarina mais completa.” A decisão pareceu inconsequente, afinal Nova York é um dos centros mundiais do balé. “Depois de ser a primeira brasileira a entrar no NYCB e formar uma audiência em seis anos de atuação, eu me mudei para um novo ambiente, onde de novo tive de provar o meu talento. A sensação era igual à de começar do zero.” Outro problema para o recém-chegado é a temida competição, “necessária, mas só válida se construtiva”. “As outras bailarinas se sentiram ameaçadas porque achavam que iam perder o lugar para alguém mais talentoso.”
No PNB, sob a direção de Boal, Carla dança os trabalhos de coreógrafos mais dinâmicos – William Forsythe e Merce Cunningham – e clássicos como “O Lago dos Cisnes”, “O Quebra-Nozes” e “Dom Quixote”. Em Seattle, ela aliou a tradição à modernidade. As diferenças entre o apego ao passado e a tendência à inovação costumam causar conflitos no universo competitivo do balé. Esse tipo de embate permeia a briga atual por poder no Balé Bolshoi.
O diretor artístico Sergei Filin, introdutor de coreografias contemporâneas na companhia russa, sofre a oposição de Nikolai Tsiskaridze, bailarino influente contrário à modernização do repertório. Na etapa mais violenta do choque de interesses dentro do Bolshoi, Filin sofreu sérias queimaduras quando, em janeiro, um desconhecido jogou ácido sulfúrico no seu rosto. Na passagem por Nova York, Carla encontrou David Hallberg, o primeiro bailarino americano a integrar a companhia russa. “Estava arrasado com os últimos acontecimentos”, diz. “Esse escândalo contraria o propósito do balé: trazer beleza ao mundo.”
http://www.valor.com.br/cultura/3027346/lirismo-em-movimento#ixzz2NLkZfrlL
Leia abaixo íntegra de texto sobre a 84 edição do Oscar publicado pelo jornal Valor Econômico
Check a piece about the 84th Annual Academy Awards published by Valor Econômico newspaper
Francisco Quinteiro Pires
Nova York
Em A Invenção de Hugo Cabret, filme de Martin Scorsese, o personagem Hugo (Asa Butterfield) convida a sua amiga Isabelle (Chloë Grace Moretz) para viver “uma aventura”. Os dois garotos encontram o que procuram dentro de uma sala de cinema onde se exibem cenas de O Homem Mosca, com o astro do cinema mudo Harold Lloyd (1893-1971). Algum tempo depois, Mama Jeanne (Helen McCrory), esposa do mágico e cineasta Georges Méliès (Ben Kingsley), afirma para eles que o esquecimento do passado não gerou “nada além de infelicidade”.
A nostalgia é a nova moda, dizem especialistas entrevistados pelo Valor Econômico sobre a 84 edição do Oscar. A Invenção de Hugo Cabret e O Artista, os favoritos à estatueta de melhor filme, prestam uma clara homenagem à infância e à magia do cinema.
Outros longas-metragens indicados à categoria de melhor filme se encaixam “nessa tendência”, segundo Annette Insdorf, professora de cinema da Columbia University. “De fato, a sugestão de uma volta ao passado tem força. O saudosismo não é só em relação ao cinema mudo”, diz Insdorf. “Meia-Noite em Paris, do Woody Allen, trata da atmosfera intelectual da Paris dos anos 1920. Cavalo de Guerra, de Steven Spielberg, é descaradamente antiquado. Mesmo A Árvore da Vida, de Terrence Malick, tem um ar nostálgico por conta do enredo calcado em fatos passados, assim como Histórias Cruzadas, de Tate Taylor, com a sua exploração dos conflitos raciais nos Estados Unidos de 50 anos atrás.”
A princípio, as indicações deste ano foram entendidas como caóticas, segundo Betsy Sharkey, crítica de cinema do jornal Los Angeles Times. Mas o foco do debate se concentrou em O Artista, do francês Michel Hazanavicius, considerado o “grande favorito” ao prêmio principal. Ao acompanhar a decadência do ator George Valentin (Jean Dujardin), o filme aborda a transição do cinema mudo para o falado no fim dos anos 1920.
Para Sharkey, a nostalgia presente com tanta clareza em O Artista, A Invenção de Hugo Cabret e Meia-Noite em Paris reflete “uma exaltação ao processo criativo do cinema”. Essa é a mesma opinião de Paoula Abou-Jaoude, membro desde 1998 da The Hollywood Foreign Press Association, responsável pela premiação do Globo de Ouro. “Existe uma saudade das histórias bem contadas. O Artista, por exemplo, é uma história clássica de amor, com um trilha sonora fantástica, que poderia ser narrada em qualquer época, apesar do seu contexto específico”, diz Abou-Jaoude.
Não fosse essa onda saudosista, diz Abou-Jaoude, Os Descendentes, de Alexander Payne, “estaria com a estatueta garantida, pois é um filme independente com um assunto bem emocional”, uma das preferências recentes da Academia. Nesse longa-metragem, Matt King (George Clooney) tenta se relacionar com as duas filhas após sua mulher sofrer um acidente de barco.
Com o sucesso inesperado de O Artista, a indústria do entretenimento passou a explorar o filão. Até o fim deste ano, vai estrear na Broadway um musical sobre a vida de Charlie Chaplin (1889-1977). Silent Life, filme sobre Rudolph Valentino, ator do cinema mudo que morreu precocemente, está em fase de pós-produção. O longa-metragem tem Isabella Rossellini como estrela.
O refúgio no passado pode ter duas explicações: alienação política e mudanças tecnológicas. Para Annette Insdorf, os indicados ao Oscar não refletem a situação corrente dos Estados Unidos, ainda convalescentes de uma forte crise econômica iniciada em 2008. “A exceção é Tudo pelo Poder, que trata de campanha eleitoral e candidatos desonestos”, diz Insdorf. Dirigido por George Clooney, o longa-metragem foi indicado à categoria de melhor roteiro adaptado. O filme baseia-se em Farragut North, peça de teatro inspirada na campanha de Howard Dean para ser o candidato a presidente do Partido Democrata em 2004.
“Os últimos anos têm sido difíceis nos EUA e, tal como a Academia, os espectadores veem o cinema como uma possibilidade de escape e não de reflexão sobre a atualidade”, diz Betsy Sharkey. “Essa atitude torna complicada a aceitação de filmes com temas políticos, sociais e econômicos. Daí a falta de fôlego de Tudo pelo Poder e Margin Call – O Dia Antes do Fim.” Indicado ao Oscar de melhor roteiro original, Margin Call, de J.C. Chandor, acompanha o comportamento de funcionários de um banco de investimentos, às vésperas de uma crise financeira de grande proporções, uma referência clara à crise de 2008.
“Existe uma rejeição aos temas pessimistas. Filmes provocadores com atuações excelentes foram ignorados: Melancolia, com a atriz Kirsten Dunst; Shame, com Michael Fassbender; e Precisamos Falar sobre o Kevin, com Tilda Swinton”, diz Sharkey. “Neste ano a Academia parece disposta a contemplar os filmes de temática mais esperançosa.”
Os enredos são, de fato, indigestos. Melancolia, do diretor Lars von Trier, narra o relacionamento de duas irmãs enquanto um planeta está prestes a colidir com a Terra. Shame, de Steve McQueen, conta detalhes da vida privada de um ninfomaníaco em Nova York. Dirigido por Lynne Ramsay, Nós Precisamos Falar sobre o Kevin mostra o drama de uma mãe envolvida com a responsabilidade sobre os atos do seu filho depois de ocorrerem assassinatos numa escola.
A alienação dos indicados ao Oscar deste ano é uma posição contrária à do Sundance Film Festival, ocorrido em Utah entre 19 e 29 de janeiro. Segundo reportagem de Brooks Barnes para The New York Times, o Sundance mostrou como a tecnologia digital ajuda os cineastas a capturar “o momento”. Os longas-metragens, sobretudo os documentários, exibem “o sonho norte-americano transformado em pesadelo”.
Não por acaso, o júri do festival elegeu como melhor filme Beasts of The Southern Wild, de Benh Zeitlin, o qual aborda, em essência, o descaso histórico com o Sul dos Estados Unidos. O melhor documentário foi The House I Live In, de Eugene Jarecki, uma análise sobre a política do governo norte-americano de combate às drogas durante as últimas quatro décadas.
Antes os filmes tinham “um atraso de 3 a 5 anos para tratar da realidade do país”, escreveu Brooks Barnes. Foi assim, por exemplo, com os ataques terroristas ao World Trade Center em 11 de setembro de 2001. Por obra da tecnologia digital, esse intervalo foi superado. Programas de edição permitem que um filme seja finalizado em até quatro meses e sem tantos custos. Agora, os cineastas trabalham em casa e com rapidez.
O Oscar mostra, porém, que o uso da tecnologia digital pode ter outro tipo de influência. “Ela também serve para arrecadar”, diz Paoula Abou-Jaoude. “Hoje o espectador pode escolher entre ver uma imagem bárbara de 3D em uma sala IMAX ou assistir a um filme em casa, o que é mais barato.” Existe uma mudança no modo como se veem e distribuem as obras cinematográficas. Os estúdios estão mais atentos à sedução tecnológica que pode tirar as pessoas do conforto do lar.
“Filmes via internet são o futuro”, diz Abou-Jaoude. O serviço, oferecido por Netflix e Amazon, por exemplo, é um fenômeno que perturba os grandes estúdios de Hollywood. Ele representa um obstáculo ao lucro outrora obtido pelos estúdios com a venda de DVDs.
Para se ter uma ideia, por US$ 3,99, o espectador compra na Amazon e vê pelo computador filmes como Meia-Noite em Paris, Histórias Cruzadas e O Homem Que Virou o Jogo, todos indicados ao Oscar de melhor filme. O preço médio de um ingresso de cinema em Nova York – US$ 12,50 – quase paga a mensalidade de um dos pacotes do Netflix. Por US$ 15,98, um assinante tem direito à entrega de DVDs pelo correio e a uma quantidade imensa de películas disponíveis para exibição via internet. O preço cai pela metade (US$ 7,99) se o pacote oferecer apenas filmes on-line.
Segundo a empresa de telecomunicações AT & T, o Netflix, tendo mais de 24 milhões de assinantes, chega a ser o responsável por cerca de 30% do fluxo de dados gerado na rede virtual dos Estados Unidos e Canadá. “Cada vez mais o controle se transfere dos estúdios para as mãos da audiência”, diz Betsy Sharkey.
A possibilidade de exibir a sua obra pela Internet fez com que os cineastas não ficassem escravos dos altos custos de distribuição. “De 5 a 7 milhões de pessoas podem hoje assistir a um filme que talvez nunca chegasse às salas de cinema”, diz Abou-Jaoude. A guerra atual se trava entre a tela grande e a tela do computador. A nostalgia vem de mais um momento de transição na história cinematográfica. Para Sharkey, “pertencemos a uma cultura da demanda e os filmes acabam seguindo essa tendência.” Se existe um limite para o poder da imaginação, ele é estabelecido pelo bolso dos espectadores.